Em
“Mitologias”, Barthes analisa, por teses, diversos fenómenos culturais
contemporâneos que se apresentam como “mitos”. Na tese “O Novo Citroën”,
Barthes analisa a construção do Citroën 19, um modelo conhecido pelo seu design
futurista e inovador tanto a nível estético como a nível funcional.
Através
desta e de muitas outras teses, Barthes procura desmascarar as estruturas ideológicas
dos códigos pela qual a sociedade burguesa se guia/guiava.
O
interessante desta tese é o quão atual ela ainda é. O fascínio pelo automóvel e o
uso deste objeto especifico como símbolo de estatuto permanece inalterado no
século XXI.
A minha terra natal é um excelente exemplo de uma comunidade onde este paradigma é extremamente visível. A cidade nortenha onde cresci é dotada de um planeamento urbano que obriga a
que os habitantes sejam dependentes de transportes pessoais, posto isto, o município é
também habitado por imensas famílias de empresários industriais que são por norma donos de
fábricas têxtil ou de calçado na periferia. Estas duas condições transformam as estradas do município
em palcos por onde desfilam repetidos e opulentos berlinas e desportivos alemães. Mas estes automóveis não são possuidos apenas pela classe alta da cidade. Aliás, a própria presença destes automóveis desperta em cidadãos de classes mais baixas
a necessidade de possuir objetos da mesma gama apesar da sua reduzida
capacidade financeira. Em vez de aproveitar as poupanças para visitar uma
cidade desconhecida ou experimentar um restaurante, os membros da classe média
preferem dedicar mais uma/umas centena/centenas de euros mensalmente para pagar um objeto que
lhes dá um falso sentido de sucesso e estatuto.
O
fenómeno do carro suscita também que o sujeito seja cada vez mais excessivo e extravagante
para comunicar o seu status quo. Hoje em dia, para afirmar estatuto através do
automóvel é preciso gastar cada vez mais. Os carros de baixa gama desafiam a
classe de luxo ao obter para eles próprios o mesmo cuidado estético, os mesmos
acessórios e extras. Para se diferenciar, o sujeito é “forçado” a sacrificar
mais para ter o mais vistoso objeto e, ironicamente, o sacrifício do trabalhador que reverte os frutos do seu àrduo trabalho para se poder "afirmar" com a compra de um carro vistoso torna-se inútil e até ingrato.
O
fascínio pelo carro é problemático por todas as razões, seja ambientais,
urbanísticas, sociais, económicas, e é um sintoma de uma sociedade infetada
pelo consumismo que se auto destrói com a própria apatia e complacência
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