quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Privação


A depravação sexual pode ser entendida de várias formas. A mim remete-me à idolatria do sexo. A sociedade faminta por prazer procura refeições invés de relações e assim, tudo é tão efémero e vazio como um almoço que nos sacia durante duas horas. Os corpos já não são alma, já não são corpos e nem mesmo objetos. São alimentos descartáveis de uma cozinha qualquer.

Trata-se de mais do que uma alienação, mas há sem dúvida um despreendimento do ser face, não só à sua materialidade própria, mas também genérica. O corpo é colocado num pedestal independente e alheio à criatura que o conduz e que passa a ser, por sua vez, conduzida pelas necessidades e desejos da sua forma, apetites esses que são projeções idílicas das consciências que a rodeiam e que se baseiam na sua vida guiada também pela matéria particular. Entra-se desta forma num ciclo de apatia espiritual e idolatria apenas daquilo que é terreno e mundano.

Fala-se numa crise de valores de toda a ordem, numa perda de capacidade refletiva, numa transferência de significados e coloca-se um termo no conceito de identidade individual. Não restam palavras puras no léxico de nenhum idioma e nenhuma esperança em qualquer texto crítico escrito na sociedade contemporânea. Caminhamos vertiginosamente para a catástrofe no olhar de todos os psicólogos, psiquiatras e psicanalistas de café. Isto é unânime, aproxima-se o fim enquanto nos afastamos cada vez mais da natureza humana. A origem do dano, essa já varia consoante as consoantes, mas as lamentações são sempre as mesmas. Típicas e tristes lamentações. Triste e ridiculamente típicas. Lamentável e tipicamente ridículas. Todas elas culminadas na abstração do significante do significado de “eu”.  


Apenas carne querem, apenas carne têm.

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