sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Room: O Quarto de Jack

Narrado pelo protagonista, Room começa com o som de uma respiração, e imagens de vários objetos que nos vão sendo reveladas. O espaço que nos é apresentado através delas, é a “casa” de Jack, um rapaz de cinco anos, e da sua mãe, Ma, uma mulher de 24 que, aos 19, foi violada.

A tal “casa”, não é nada mais, nada menos, que uma pequena barraca, com 11 metros quadrados, a que os dois deram o nome de Quarto (Room). Embora Jack não saiba, o sítio onde ele se sente completamente seguro e protegido, é também a prisão onde a mãe tem sido mantida contra a sua vontade.

O Quarto, e todas as coisas que dele fazem parte, é o que Jack conhece. Para ele, aquele quarto é o mundo inteiro. Graças à forma como o espaço é filmado, permitindo-nos ter uma visão atenta e detalhada, aproximada, mas ao mesmo tempo transmitindo-nos a ideia de profundidade, somos capazes de nos enquadrar naquele ambiente e senti-lo tão grande quanto ele é para Jack. Prestando atenção à forma como o filme se desenvolve e é apresentado, pelo menos inicialmente, é-nos muito mais transmitida a ideia de conforto e inocência tranquila (de Jack), do que propriamente a claustrofobia e terror sentidos pela sua mãe.



De alguma forma, Ma foi capaz de tornar aquilo que é o seu inferno, num “conto de fadas”, fazendo Jack acreditar que a vida que levam é excelente, e que nada mais existe para além daquele quarto. Não tendo escolhido ser mãe, Ma desempenha um excelente papel como tal, pondo em primeiro lugar a segurança e o bem estar do filho, mesmo tendo em conta as condições que lhe são impostas.

Estando cinematograficamente muito bem caracterizado, é incrível como este filme que derivou do romance de Emma Donoghue, nos consegue transmitir tão realisticamente a realidade de uma criança que tão pouco conhece. De facto, se não nos fosse apresentado o mundo como o conhecemos, razões nenhumas teríamos para acreditar que aquele em que habitamos existiria desta forma ou de outra. “Ver para crer”, não é o que se diz? E também Jack, cego para com o exterior, não acreditou quando a sua mãe lhe explicou que aquele pequeno mundo era apenas uma parte minúscula do mundo real que ele desconhecia.

Ma: The world is so big, it’s so big you wouldn’t even believe it! And Room is just one stinky part of it!
Jack (angry): Room is not stinky, I don’t believe in your stinky world!!!

Jack é tão ingénuo quanto os prisioneiros da Alegoria da Caverna que toda a sua vida estiveram acorrentados e presos a uma realidade incrivelmente díspar da do mundo exterior. Tal como o prisioneiro que não acreditou no fogo, quando Jack experienciou o verdadeiro mundo, tomou-o como um novo planeta, e não como algo que afinal sempre fora verdadeiro, mas que estivera escondido.

O mundo em que nascemos e em que somos enquadrados durante a nossa vida, é aquele que tomamos como nosso e que nos torna quem somos. É o ambiente que nos envolve que nos forma e a maneira como desenvolvemos o nosso psíquico. Talvez Jack não “sonhasse” tanto se fosse um rapaz como os outros, talvez a sua imaginação não fosse tão crucial quanto foi para a sua vida. A verdade é que, graças à sua mãe, Jack foi capaz de construir um mundo só dele, onde era feliz e onde todos os objetos eram seus amigos.


Acho particularmente interessante, a forma como este filme nos dá a entender o paralelo existente entre liberdade exterior e interior. Os limites físicos foram ultrapassados, e apesar de estar completamente fechado num espaço pequeníssimo, Jack foi capaz de ser livre e feliz na sua inocência. Já Ma, como sabia aquilo que lhe estava a ser privado, sentiu necessidade de lutar pela sua liberdade. A verdade, é que não desejamos o que não conhecemos. Quem não sabe, é como quem não vê.

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