sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

White Man's Burden


A profunda astúcia da operação Bichon é a de dar a ver o mundo negro através dos olhos da criança branca: tudo aí assume, evidentemente, a aparência de um guignol (...) No fundo, o Preto não tem uma vida plena e autônoma: é um objeto bizarro; ele é reduzido a uma função parasita, a de distrair os homens brancos através do seu barroco vagamente ameaçador: a Africa é um guignol um tanto perigoso.
— BARTHES, R. (1957/1988) “Bichon Entre os Pretos“ In Mitologias. Lisboa: Ed. 70. p.58-59.

Barthes procura comentar na sua obra “Mitologias”, uma reportagem, envolta na “falsa coragem” de um casal de professores e o seu bébe, Bichon. Com o objetivo de ir à descoberta da "terra de canibais, na procura de inspiração para a sua pintura. Tendo sido publicada, por parte da revista Match, famosa revista Parisiense dos anos 50.

Roland Barthes procura desenvolver em todo o texto uma relação entre povos sobre uma mesma realidade, (branco).
Toda a sua composição transpõe claramente uma visão desadequada aos dias corrente. O contexto colonial, evidente, do qual, não temos uma visão superior enquanto espectador, mas sim uma visão observadora. Não saberíamos o que entender/fazer face a esse mesmo ponto da história. Apenas uma visão aproximada dos ideais culturais.
O que seriamos não teria significado se não fosse o nosso meio envolvente, expectativa - Ser falado.
E nesta narrativa, tão real, a noção de Preto ou até mesmo a noção de Branco, advém dessa mesma expectativa. Esta fala dos outros, sobre nós, constitui-nos, enquanto contribuição para o que o sujeito é.
O sujeito é falado pelos outros, logo é denominado pelos outros.

A atribuição de significações, feita por parte da revista, advém de uma ideologia “falada”, anteriormente. Estamos a ter em atenção uma publicação que data 1957, enraizada em princípios de colonização, associada intrinsecamente a valores "white savior" (pessoa de raça branca que atua de forma a ajudar pessoas das restantes raças, por via de alguma forma de auxilio, procurando disfarçar o verdadeiro contextos egoísta/ egocêntrico da ação).
 Este tipo de comportamentos, é adotado na atualidade por via das redes sociais. Intensificando de forma imoral a simplificação excessiva da verdade, estereotipização, etc. em aproveitamento da “cultura problemática” e desviando as verdadeiras intenções do voluntarismo, que infelizmente, vêm a focar-se mais no “salvador”, que no sujeito ao qual este foca o seu auxílio.
Esta relação é intensificada pelo o uso da criança, por ser o ser mais simples enquanto representante da raça (branca), novo, indefeso, ingénuo, à mercê de “perigos estrangeiros”. Que em contrapartida entende-se como sendo dos elementos de uma sociedade, (o mais isento possível), de quais queres significâncias, uma vez que ainda não domina essa perceção do “ser falado”.

Embora a distância temporal, ambas as publicações/ações, em análise, intendem o mesmo propósito, contornar os significantes atribuídos de um “falar” pelos outros, por via de países, que tendem a ser subjugados e simplificados à sua denominação do outro, um guignol.
Nesta viragem, entende-se que o sujeito não enquanto significante, mas sim do lado das ideias, do significado, da ideologia. Primorosamente, pode estar do lado de uma Consciência Falsa. Invertendo a perspetiva de forma condescendente. 

Take up the White Man's burden
The savage wars of peace
Fill full the mouth of Famine
And bid the sickness cease;
And when your goal is nearest
The end for others sought,
Watch sloth and heathen Folly
Bring all your hopes to nought.”
 Rudyard Kipling, "The White Man's Burden”, 1889. 


Referências:

BARTHES, R. (1957/1988) “Bichon Entre os Pretos” In Mitologias. Lisboa: Ed. 70. 
AJ+ (2017). “White Savior Complex”. [video]
SAIH. (2017). No more selfies with African kids.. [online]
Kipling, R. (1889). "The White Man's Burden: The United States and the Philippine Islands". The New York Sun.

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