Um dos aspectos que acho curioso quando me deparo com filmes de ficção científica dos anos 70 e 80 é a forma como as pessoas imaginavam que o futuro iria ser. Carros voadores, robôs hiper realistas, hologramas, tudo no então longínquo ano de 2007 (por exemplo). Dito desta forma, as expectativas que haviam parecem quase absurdas, mas é interessante reflectir o que motivou as pessoas a fazerem este tipo de previsões, e mais assustador, o que é que acertaram sobre o nosso presente. Assim, falemos Blade Runner.
Dirigido por Ridley Scott, é baseado no romance Do Androids Dream of Electric Sheep? de Philip K. Dick, e conta com actores como Harrison Ford, Rutger Hauer ou Sean Young. Apesar de não ter sido muito popular quando saiu, Blade Runner tem vindo a ganhar popularidade ao longo dos anos, atingindo o status de cult classic e tornando-se um paradigma da ficção científica, que ainda hoje inspirou obras como, por exemplo série a série de manga Ghost in the Chell.
O filme original saiu em 1982 mas o ano passado saiu uma sequela, Blade Runner 2049, que contra as expectativas, achei um filme bastante bom, talvez um do melhores que vi em 2017. Apesar de ser uma sequela, aguenta-se muitíssimo bem individualmente e expande o mundo do primeiro filme sem destruir o que este conseguiu. Ainda assim, se tivesse que escolher entre os dois, seria uma luta renhida, mas optaria pelo primeiro.
A narrativa passa-se em Los Angeles no ano de 2019, onde carros voadores, colónias espaciais ou andróides virtualmente idênticos a seres humanos, a que chamam Replicant, são uma realidade. A serie mais recente, Nexus 6, a mais avançada é mais forte e tão inteligente quanto um ser humano. Estes são utilizados como escravos em trabalhos diversos, e após um motim, são proibidos na Terra. Equipa de polícias especais, com o nome Blade Runners, tem a função de “retirar” todos os replicant que desobedecem a ordens.
Esta é sensivelmente a informação que nos é dada antes do verdadeiro início do filme, nos opening titles, ao estilo clássico dos anos 80, num pequeno texto. Imediatamente a seguir cortamos para primeira vista da da cidade de Los Angeles em 2019, uma das minha cenas favoritas. Não possível ver onde começa ou acaba a cidade e a sua silhueta parece infinita. Não é possível ver detalhes nos edifícios, apenas as suas luzes que se estendem como um tapete de estrelas. O que mais se destaca são estas chaminés de onde saem nuvens de fumo e de fogo e enquanto espécie de veículo que atravessa o céu. A música que acompanha é por um lado clama e surreal, mas em conjunto com a imagem da cidade ganha um caracter triste e algo monótono. Ao longe vemos um edifício com uma silhueta diferente, quase uma pirâmide, mais alto e com uma silhueta claramente diferente dos restantes arranha céus. A grande estatura faz com que pareça que vigia toda a cidade. Enquanto nos aproximamos a música ganha uma intensidade diferente, dando a impressão que algo não está bem.
Na minha opinião, isto é o que destaca Blade Runner como filme: a atmosfera. O conjunto entre aquilo que vemos e ouvimos submerge-nos na história que pretende contar. Basta apenas a primeira cena para conseguirmos perceber perfeitamente o caracter do filme.
A personalidade por detrás da música, o compositor grego Vengelis utiliza uma mistura de sintetizadores e instrumentos de cordas para criar o característico zumbido recorrente ao longo do filme, que pretende recriar o ruído permanece da cidade e dos seu habitantes. Melancólico mas misterioso.
Por outro lado o aspecto da cidade de Los Angeles de 2019 conta com a colaboração de nomes como Syd Mead, também responsável pelo design de filmes como Tron ou Star Teck. A chave para criar um paisagem de ficção cientifica é o balanço entre elementos que existem na realidade e o que “vem do futuro”. Tudo tem um aspecto claramente futurista mas ao mesmo tempo familiar. No caso de Blade Runner, o futuro imaginado não é uma versão utópica, mas sim realista. A cidade está sobrecarregada, os edificamos altos dão uma sensação quase claustrofóbica às ruas, a chuva permanente trás uma sensação de tristeza e reflete as luzes intensas da cidade. Todos os locais estão repletos de detalhes, mas não sobrecarregam a imagem, mostram uma sociedade estratificada
Finalmente, não podemos passar sem abordar o tema filosófico da narrativa. Há questão da exploração dos Replicant, a forma como foram criados especificamente para servir a humanidade e que é que isso diz sobre a sociedade de 2019. Onde acaba a máquina e começa o homem? O que faz de nós verdadeiramente humanos? A melhor parte é que o filme nunca nos dá respostas específicas as estas perguntas. Não há uma moral da história definida. A única coisa que temos é uma sucessão de eventos que ocorre na narrativa em consequência das opiniões e respostas das personagens a estas questões. De resto, somos obrigados a tirar as nossas próprias conclusões.
Finalmente só me deixa recomendar que dêem uma vista de olhos ao filme. Há muitos mais aspectos interessantes que eu não pude abordar. O meu objectivo foi tentar revelar o menos possível em relação à história e às personagens, tentando focar-me nos aspectos visuais. Recomendo também que vejam também o novo que saiu o ano passado. O nosso presente pode não ser o futuro idealizado de muitos dos filme retratavam nos anos 80, mas já estivemos mais longe. Quem sabe se corresponderemos ao futuro de 2049.
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