quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Constelações

" (...) somos apenas partículas governadas por uma série de leis muito particulares, aos tombos por aí por todo o lado."




















Constellations dá nome à peça de Nick Payne que me proporcionou um dos serões mais agradáveis que tive na capital até então. João Lourenço e Vera San Payo de Lemos são os verdadeiros culpados pela genial iniciativa de adaptar a obra do dramaturgo britânico para a língua portuguesa. O cenário, à partida, contido e do mais simples que pode ser apresentado, revela-se a escolha mais inteligente para fazer brilhar as únicas estrelas daquele momento: Mariana e Rodrigo. A exímia incorporação destas personagens é feita por Joana Brandão e Pedro Laginha, que ao longo de uma hora e meia de espetáculo estão em cena apenas suportados pelo jogo de luzes e pouco mais. Num diálogo constante, ritmado e maravilhosamente repetitivo, a voz e corpo dos atores são as peças fundamentais nesta história de amor invulgar que é contada por um prisma completamente diferente, ou talvez, por vários.

Suportado numa das teses da física quântica segundo a qual existem diversas dimensões e universos paralelos, o argumento é o que mais fez valer a ida ao teatro. Encenado no Royal Court Theatre pela primeira vez em 2012, este texto rendeu algumas premiações e inúmeras críticas enaltecendo o guião desta “típica” história de amor que passando de temas como apicultura a teorias astrológicas, culmina em duas personagens que se apaixonam depois de comprovarem que não são capazes de lamber os próprios cotovelos. E que ulteriormente, afinal, nunca chegam sequer a iniciar um diálogo porque Rodrigo está comprometido. Na sequência repetida, já é Mariana o impedimento. Mas, entretanto, eles estão juntos e felizes. Depois, juntos e infelizes. E nesta rápida repetição conseguimos questionar-nos, entre um fôlego e outro, que podíamos não estar ali. Cada micro ou macro decisão pessoal nos conduz, fechando e abrindo possibilidades ao longo do caminho, o que torna necessário e urgente este momento reflexivo.


“It’s rare these days, at any time really, to encounter a play which owes nothing to theatrical influences and which exists as a singular astonishment, at once eloquent and mysterious but which nonetheless articulates within its own idiosyncratic idiom something that touches an audience as real.”

John Lahr no The New Yorker
15 de Fevereiro de 2012 


Composição extraordinária e uma peculiaridade que capta o espectador desde o primeiro segundo, fragmentos que se unem e criam uma verdadeira obra de introspecção profunda que nos interroga diretamente à cerca dos nossos possíveis arrependimentos e da infinidade de panoramas paralelos à nossa cronologia, escrita a cada instante, sem nunca poder ser consultada ou intersectada. Uma peça sobre o tempo e os seus múltiplos desvios, aconselhável em qualquer cenário ou universo.

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