segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Bichon, o ídolo

Roland Barthes na sua obra Mitologias, vem a criticar a história de Bichon, uma criança branca que é levada para uma terra designada apenas como a dos Negros Vermelhos, como foi citado no artigo da revista March que o autor vem evidenciar de caráter racista. No entanto existe outro fenómeno que pode se evidenciar nesta critica, designado na atualidade por "white savior complex". 

O fenómeno do "complexo do salvador branco", como se designa em português, está bastante vincado na sociedade actualmente, não só devido às várias redes de comunicação e publicidade de quem somos vitimas, mas também à variedade de projetos e associações que foram desenvolvidas em sua função. Neste momento um dos projetos com mais adesão são os programas de apadrinhamento de crianças de países considerados do "terceiro mundo". Este tipo de programas são normalmente os favoritos, pois são pequenos gestos de altruísmo que fazem a diferença, apresentados como uma solução fácil, sem deixar de existir um distanciamento do problema, da realidade. 


Bichon é demonstrado com um ídolo, pelos seus feitos e mais ainda no contexto em que estes se realizaram, onde os negros são representados de uma forma bastante abstrata, apenas como um fundo para enaltecer o protagonista. Esta é a forma como a relação de apadrinhamento entre um membro da sociedade e uma das crianças funcionam, o "padrinho" é considerado como um exemplo, um "bem feitor" , e o "afilhado" de quem não se sabe nada além de uma fotografia que é enviada com o certificado de apadrinhamento, e umas cartas esporádicas numa tentativa de humanizar. 

"As façanhas de Bichon são semelhantes às das ascensões espetaculares: demonstrações de ordem ética, que só adquirem o seu valor final com a publicidade que lhes é dada."


Assim, a adesão a estes programas são muitas vezes também utilizados como meios de auto satisfazer e auto glorificar o indivíduo, este que não se vai impedir de publicitar tal feito, apresentando nas redes sociais e ao seu núcleo de amigos referindo-se à criança como sua, como uma posse, este é um exemplo que eu vi acontecer pessoalmente. Deste modo existe uma objetivação face a estas crianças, como um objeto de estatuto, mais por parte daqueles que têm mais possibilidades financeiras, como forma de mostrar mesmo isso bem como os seus atos de altruísmo.


No entanto, mesmo que estes programas devam ser analisados bem como os atos que os evolvem, não deixam de ter como fim algo positivo e contribuir para uma vida melhor para aqueles que necessitam, mesmo que sendo um pequeno gesto. Daí que apenas se questiona a motivação que leva a estes atos, se é puro altruísmo ou se existe um narcisismo e uma pré concepção da sociedade para a validação do indivíduo. 

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.