Em exposição na Fábrica Features estiveram, durante parte do mês de Dezembro, várias ilustrações da editora Triciclo, que resulta do projecto de três ilustradores: Ana Braga, Inês Machado e Tiago Guerreiro. Uma editora com a intenção de criar publicações de pequena tiragem, apoiadas no conceito de fanzines e de livro de artista infantil, com bons acabamentos que se possam tornar objectos colecionáveis. A revista Triciclo desafia os leitores a encontrar a resposta a enigmas e quebra-cabeças. Desafios de ligar imagens, unir pontos, perguntas “quem é quem”, palavras cruzadas, sopas de letras e outros jogos que mantém o leitor interessado quer no aspecto visual da publicação, quer no seu conteúdo, por isto mesmo também os mais velhos acabam por se deixar cativar pelas publicações.
A expor estavam obras dos três ilustradores, que como é óbvio não têm a mesma linguagem ou grafismo, no entanto, por trabalharem em conjunto num mesmo núcleo e usarem as suas obras na mesma exposição, e dentro da editora, para publicações em comum, são obrigados a manter uma coerência visual e gráfica em relação a técnicas, cores e formas. Este esforço é visível nas obras expostas, a coesão entre os vários desenhos é permanente. Feitos usando técnicas de impressão como a risografia e serigrafia que conferem características de diferentes texturas quando impressas no papel.
As ilustrações apresentadas destacavam-se pelas amplas zonas de cor plana, separadas por uma linha de cor branca que conferia uma pureza nas composições, sempre simples e depuradas. As texturas dos objectos, elementos naturais e até das roupas e cabelos dos personagens desenhados aparecem padronizados com pontos, linhas, ziguezagues entre outros, resumindo a informação, tornando-a mais directa e simples de interpretar. Em relação à cor pude também notar que existia uma síntese da mesma, pois em cada obra não existia mais do que três cores, que entre todos os desenhos em exposição, não existia quase alternância, a gama de cores ao longos destes mantinha-se entre o laranja, amarelo, azul-turquesa, verde, magenta e a utilização complementar do branco.
A razão pela qual decidi visitar a exposição foi porque esta é sem dúvida uma fusão entre as artes gráficas e a história de arte. A junção de técnicas modernas de impressão para a construção de ilustrações a partir de pinturas quadros antigos chamou-me à atenção pois sem dúvida juntava as duas das coisas que mais me atraem na arte, a ilustração e e a história. Ver quadros como “O Baloiço” de Fragonard ou a “Bailarina Verde” de Edgar Degas, representados de uma forma tão simplificada, mas conseguindo manter a sua pureza e elegância originais é algo extraordinário.
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| O Baloiço, Jean-Honoré Fragonard, 1976 |
Estamos habituados a ver estes quadros em grandes museus, em grandes molduras com ornamentos dourados, onde temos de ficar em grandes filas de espera, no entanto, percebemos que estes podem ser vistos de uma perspectiva e num contexto diferente, num contexto. Em tempos pintores, escultores e desenhistas, eram considerados os verdadeiros artistas e intelectuais, as belas artes predominavam sobre as artes gráficas, mas no desenrolar dos séculos, criou-se uma relação entre as duas vertentes. Esta relação é assumida quando pintores como Lautrec ou Amadeo de Souza-Cardoso se tornam autênticos artistas gráficos, explorando e integrando nas suas obras a tipografia e criando cartazes para publicidades e obras ilustradas. As duas vertentes fundem-se. Nesta mesma editora, uma das ilustradoras, Inês Machado, formou-se em pintura, sabendo depois adaptar as suas aprendizagens ao design gráfico. A exposição demonstra que até mesmo as obras mais clássicas podem ter uma abordagem mais moderna, e um dos aspectos mais curiosos é deambular pela sala, observar as ilustrações e associar as respectivas pinturas e tentar perceber o processo de construção daquelas formas.
Uma das vertentes do curso de Design de Comunicação que mais me interessa é a de montagem de exposições e da organização de obras num espaço, em exposições e museus, e como tal, quando visito uma exposição, para além dos aspectos gráficos e temáticos, tenho sempre especial atenção à disposição da exposição e à forma como esta está organizada. Ao planificar uma exposição, o designer deve ter em consideração não apenas o público mais informado, mas também o mais leigo, de forma a poder criar um espaço onde este se sinta cativado a voltar, para isto, deve tirar partido de vários recursos visuais e atrativos como a imagem, a cor, os formatos, os sistemas de suporte e os media como o vídeo e o som.
Nesta exposição todas as obras estavam expostas de forma bastante simples, as folhas estavam presas na parede através de pequenos pregos, folhas estas que não ultrapassavam o tamanho A4, e as ilustrações o tamanho A5, formando uma moldura. O espaço da exposição era mínimo, uma pequena sala não completamente rodeada por quatro paredes disponíveis para a exposição. As obras estavam expostas ao longo de duas paredes numa única fila, lado a lado, o que permitia fazer um trajecto linear e simples, que terminava na entrada da loja da Fábrica. Ou seja, o trajecto era feito de forma a conduzir o visitante à loja.
A interacção com o observador ficou um pouco aquém, dado que nem a própria identificação da exposição era completamente visível quando à entrada do espaço. Novamente, o designer deve ter em consideração também o público menos informado, e sendo esta uma exposição que se desatinava a todas as idades, à semelhança das publicações da editora, parece-me que não sendo aqueles que procuravam efectivamente o local e a exposição em si, esta não teria muita procura. Por outro lado, reparei que existia uma ilustração que se destacava em termos de tamanho, “Um banho em Asnières” de Georges Seurat. A pergunta que podemos fazer é: Porquê dar um tão grande destaque a esta obra em especial? Penso que a razão que levou a esta distinção foi efectivamente o facto de esta ser uma das obras mais conhecidas em exposição, tentando atrair o visitante, obrigando-o a olhar para o que os seus olhos já conhecem, e depois então começar a procurar para além disto.
Assim, esta exposição, conquista o visitante quer pelas características gráficas quer pelo tema, que acaba por ter uma função didáctica, não só para as crianças mas também para os adultos, que olhando para as ilustrações aprendem a associar e a reconhecer as famosas obras de arte, talvez até de uma forma mais interessante e moderna, que lhes chama mais a atenção por serem técnicas de simplificação e síntese que hoje nos são mais familiares e fáceis de interpretar.


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