Atlas do Corpo e da Imaginação, Gonçalo M. Tavares
“sou infeliz porque fui demasiado rápido ou extremamente lento”, diz Gonçalo M. Tavares numa das reflexões presentes no seu Atlas do Corpo e da Imaginação.
Esta afirmação fez-me pensar sobre a vida em sociedade, vida esta que se resume a uma procura da velocidade certa, do ritmo certo. Gonçalo M. Tavares afirma ainda: “a cidade utópica (feliz) não é a que tem as leis certas como os filósofos sempre defenderam, mas sim a que tem o ritmo certo”.
E claro que as leis servem como mecanismo de procura desse equilíbrio de ritmos e velocidades, na medida em que definem mínimos e máximos aceitáveis para a nossa atividade no mundo (procurando sempre não criar desordem). Mas apesar de nos darem esses limites, muitas vezes não nos dão a velocidade certa e exata — temos que ser nós a procura-la individualmente —, mas quanto dão, quando realmente nos é imposta uma velocidade exata, o descontentamento e o grito pela liberdade faz-se ouvir mais alto do que nunca.
Queremos ser livres e escolher o nosso ritmo, no entanto e simultaneamente, não somos felizes, não nos dizemos felizes ou satisfeitos com o que somos ou temos.
Vemos a felicidade como um estado (estado de felicidade) que ainda está por alcançar, uma velocidade por atingir. Isto leva-me a crer que, diretamente relacionada com esta esperança e fome de uma velocidade certa está a vida em sociedade e a ideologia patentes, com todas as suas manipulações. A vida de todos os dias que nos incentiva a ser gananciosos e compulsivos por tudo aquilo que não precisamos e um por modo de vida que se diz ser capaz de nos dar a felicidade esperada.
A sociedade dos dias de hoje empurra-nos para um constante descontentamento e fome de mais; empurra-nos para a velocidade e o ritmo acelerado que vivemos todos os dias pensando que tudo é fruto da nossa liberdade de movimentos. Uma velocidade e um ritmo que não pára, que não pode parar.
Não será isto uma prisão em vez de uma libertação? É-nos dito que podemos fazer tudo menos parar.
A sociedade exige que não fiquemos parados. Como se tudo fosse fundamental para o bom funcionamento desta grande máquina que é a vida numa sociedade moderna.
Por outro lado, não nos queixamos, não só porque “temos liberdade”, mas porque queremos ser aceites. Queremos pertencer a algo maior do que nós, e, por isso participamos cegamente no que nos é proposto. Mas e se nos cansarmos de ser livres? Se nos cansarmos de estar sempre em movimento? Se quisermos só viver, estar vivos, ficar imóveis por um instante? Deixamos a nossa liberdade para trás ou somos livres de o fazer e de o ser?
Reflexão II
10218
Reflexão II
10218
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