domingo, 7 de janeiro de 2018

"O Fantasma", de João Pedro Rodrigues - Recensão






                                                            Publicada em 2000 pela Editora, Rosa Filmes que tinha já colocado a curta-metragem "Parabèns" no festival de Veneza, anteriormente





   Em "O Fantasma", a primeira longa-metragem de João Pedro Rodrigues, deparamo-nos com a personagem de Sérgio, uma personalidade que se vai descobrir mais instável face a impossibilidade de reciprocidade do amor - e, por isso, à ausência do «eu» tornando-se gradualmente no próprio fantasma. E antes que o seja, encontramo-nos em Lisboa, mas uma Lisboa nocturna cuja a paisagem urbana é dominada pelas viagens de camião dos homens do lixo, que tomam a cidade enquanto esta dorme, sem nunca serem vistos. "Percorrem, no negro da noite, rotas secretas escondidas no labirinto da cidade".


Sérgio e o fantasma:


"Procurei corpos e olhares virgens. Um corpo tenso e palpável, feito de músculos e pele. Um nariz que fareja. Uma boca que arfa. Uma língua que lambe. Um sexo insaciável. Um olhar luminoso e negro, impiedoso e implacável. Encontrei o Sérgio.", afirma João
Pedro Rodrigues numa entrevista dada à PortugalGay.pt


   De facto, existe em Sérgio toda a faceta carnal de um bicho de mato. Um lobo pérfido que urina na cama do seu "amado" para marcar território numa tentativa animal orientada pelo instinto. Deste modo, participamos da personagem que nos é apresentada sem nenhum tipo de encanto, muito pelo contrário, consumido por um desejo insaciável, sexo anónimo e a estranha vigilância de um polícia, Sérgio é enfeitiçado e fica obcecado por um rapaz. Claro que as coisas estão condenadas à partida, porque este é heterossexual, oferecendo o singular aspecto do masoquismo porque Sérgio aposta neste amor. No entanto, deixa de ter um papel passivo na recolha do lixo e começa a vasculha-lo, e a vigiar o rapaz como um voyeur. 
   A partir do momento que é confrontado com a rejeição, este toma comportamentos que o levam à sua completa destruição. Começa por usar um fato de látex negro - a máscara do Fantasma -  que obedece a certas práticas sexuais e hábitos de teor animal. Assim, o fato de látex acaba por ser a última pele que veste e, por isso a sua última morada. Numa tentativa de fuga desesperada, foge para o aterro do lixo camuflando-se e deixa quase de existir como animal ou/e vegetal, passando a adoptar um estado mineral uma vez que o filme parece estar noutro planeta - alusões ao fantástico -


A brutalidade do desejo:

   Mais que uma ficção, "o Fantasma" é um filme sobre a homossexualidade masculina que contribui para a edificação do cinema gay. 
  Deste modo, imprimem-se do prisma cinematográfico, a brutalidade infame da narração, a morbidez firmemente sexual, o desejo iludido face à atração pelo abismo e à insatisfação do desejo animal, do corpo sexual.










Segundo o jornal diário português, PÚBLICO, João Pedro Rodrigues foi equiparado com a Genet e Fassbinder: "Temos a certeza de que João Pedro Rodrigues realizou o grande filme homossexual desta época, a colocar ao lado de 'Un chant d'amour', de Jean Genet; de 'Pink Narcissus', filme atribuído a Kenneth Anger; e de 'Querelle', de Fassbinder, que cada um à sua maneira contribuem para o cinema que é gay, mas também obra de arte", escreve Olivier Séguret no "Libération"









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